Diálogos de um moribundo recém-nascido

"Estou morrendo, é verdade.
Não da gripe que me assola,
diga-se de passagem."
"Mas quem clama por mim além de vós?
Ó colchão,
Ó sofá!"
"Deite e espere..." Ela sussurra.
Novamente a Enfermidade leu minha mão.
"Estou morrendo..."

Alguém me cobra novidades,

eis que respondo:
"Nenhum avanço por aqui, capitão!"
"Parece que não haverá nenhum,
de qualquer forma."
"Mas... Eu estou esperando!"




"Sei disso, todos nós estamos"

Disse o Capitão da Humanidade.
"Estou morrendo..."

"Erga a folha,

olhe-a sem piedade,
rabisque sua ideia como uma faca rabisca a carne."
Disse o Poeta Violento.
Ergo-a então,
como dizia a instrução.
Apodrece exaustão no sangue.
"Estou morrendo..."
"Não de gripe no entanto,
pois esta me namora há tempos."
"Febre então?"
Sugeriu a Enfermidade.
"Não, não. Muita areia pro meu caminhão."
"Mesmo assim, vai morrer!" Gargalhou.
"Tão certo..." Sussurrei.

"Rasga! Rasga! Rasga!"

Um pombo tão branco quanto o papel
parte o céu e meu sentidos.
"Rasga!"
"Mas eu ainda nem comecei!" Protesto.
Deveria aprender, protestar não funciona.
Levo a folha com tanto potencial
direto para o limbo.
A lixeira é tabelada. Uma cesta.
"Três pontos! Três pontos!"
O pombo grasna.

"Sente aqui, meu amor.

Espere sua vez, ela vai chegar."
"Não quero! Não quero!" Berro.
Deveria aprender, berrar não funciona.
"Vai chegar... Estou morrendo..."
"Sei disso." Meu Amor disse.
"Todos sabemos."
Declararam todos sentados.
"Sente aqui amor, porque em pé cansa."
"Estou morrendo..."
Balbuciei e sentei.

Um comentário: